quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

PSIU! VOCÊ ESTÁ VIVO

Com licença! Ei moça, ei moço, você pode olhar para mim enquanto eu falo?
Eles olharam por cima da pequena tela e como não falei por três segundos, continuaram suas vidas de pupilas dilatadas e dedos frenéticos nessa extensão do corpo que cabe na palma da mão.
Oras, não vou ser hipócrita, também gosto desse mundo conectado e hiperativo, sustentado por plataformas e aplicativos, que me levam do Ahú de Baixo a Paris literalmente num piscar de olhos.
Eu queria dizer para eles que no nosso bairro o carro do sonho acabou de passar, que os cães e gatos deram uma trégua nessa guerrinha criada por nós, homens, que a amoreira da esquina foi cortada, que o quilo da banana estava em oferta no mercadinho, mas a moça, o moço estão em outros links, quando poderiam estar nuns drinks, convenhamos.
E então me debato no limite entre ser nascida no século XX e viver (ainda) a ascendência da curva no século XXI e me beliscar mentalmente o tempo todo para saber que estou viva. Ah! as instituições sabem que estou viva, eu existo para a Receita. Sou um número longo. Existo em URLs, em busca do Google, ah, eu existo, uma crise a menos.
Eu, você e a Candinha da esquina somos notificações. Visualizações, somos likes e emojis. Olha só, e eu achando que não era nada!!!!
Mas eu entro no carro e começo a cantar sozinha e recitar meus mantras. Porque eu preciso sentir que faço isso sem condutores físicos, porque sou de carne, osso, sangue e colesterol baixo. Não quero enfrentar nem debater que as peles não se tocam com freqüência, pois basta ser um pim notificável, que você se faz presente. Fique contente com isso.
Eu só queria dizer “psiu! você está vivo”. E quem sabe tomar um cafezinho.

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